quinta-feira, 10 de abril de 2014

Tocando 'Like A Rolling Stone' na Máquina de Escrever

A vida muda, com a frequência em que Bob Dylan muda as letras de suas músicas. E honestamente, minha esperança é acreditar que essa seja a melhor parte...

Mas é sempre curioso imaginar o tempo como algo linear. Pois em um dia meu medo era o alistamento militar e meu encantamento os 'discos' que tinham todas as músicas no mesmo lado. E em um piscar de olhos, nem tão velho nem tão jovem, mudamos de século, de milênio até, e assim sem regras nem fim do mundo, pouca coisa mudou de fato. No novo milênio meu medo era conseguir pagar todas as contas sem pedir arrego, e curiosamente, conseguir aquele vinil do Pink Floyd pra ouvir junto com 'O Mágico de Oz'.

Mudaram as regras gramaticais e eu ainda faço um puta esforço pra lembrar a forma correta de conjugar os verbos. Mudaram as tecnologias e eu ainda guardo em algum lugar a minha máquina de escrever portátil, que curiosamente, de portátil não tem nada. Mudaram também as formas como a informação se espalha, em uma política curiosa de quanto menos papel melhor, com a urgência do 'just in time'. E apesar disso tudo, ainda me encanta escrever usando lápis em cadernos sem pauta.

Me encanta ter ainda o primeiro disco que ganhei aos 8 anos, e me encanta ter crescido vivendo a magía de um aparelho de som com duplo deck.

Caminho pela rua e vejo um mundo completamente dependente de parafernálias tecnológicas com telas touchscreen e bluetoths. Nessas horas confesso intimamente, houve um tempo em que até telefones celulares pareciam desnecessários e complexos pra minha cabeça ingênua. Mesmo passando a maior parte da vida trabalhando com tecnologia, é a simplicidade que me encanta. Não sou desses apaixonados pelo vintage, sou só um pouco velho por dentro. Não tenho culpa, cresci vendo estes filmes onde o mocinho fuma um cigarro com o pé encostado no muro, olhando o mundo por cima dos óculos escuros. E em meio as dúvidas sobre sua jornada, sempre aparece um velho sábio, que já foi mocinho em outro filme, lhe mostrando com clichês e frases feitas, o melhor caminho.

'Sexo, drogas e rock n roll' não era vintage e o mocinho do filme esbanjava aptidões heroicas, mesmo quando quando seu 'velho guru' era só um errante bêbado. Os anos 80 não eram vintage e eu era só um guri careta, que não gostava de Led Zeppelin e nunca teve saco pra decorar a letra de Faroeste Caboclo. E talvez pelo olhar inalcançável das meninas bonitas da 8º série, nas minhas infantis ilusões, nunca me serviu a fantasia de mocinho. Não bastavam os devaneios e poemas que confessei aos tipos da máquina de escrever, nem meu precoce conhecimento sobre astronomia. Não havia vaga de herói nesse filme, no meu filme, e por me faltarem boas piadas, me bastou ser o errante.

É sempre difícil não imaginar o tempo como algo linear, e cada história, uma página datilografada as pressas, sem o direito de usar o backspace pra corrigir pequenos enganos. E assim como placebo, inventamos um marca textos destacando linhas a esmo, quando na verdade, só queremos tirar a atenção dos espinhos do texto. E por isso, se somos todos o clichê de um livro aberto, de uma história tão exposta, tão explícita, sempre haverá capítulos rabiscados e páginas arrancadas. É melhor assim, acredite.

Nem tão jovem, nem tão velho, mas o século mudou, o milênio também. Não servi o exército e consegui vários discos do Pink Floyd. Abri mão de trabalhar com tecnologia. Nenhum velho, mocinho de outro filme, apareceu com conselhos que mudassem o rumo da minha história. E talvez por isso, no fundo, tive que ser meu próprio velho.

Talvez Bob Dylan mude tanto as letras de suas músicas, porque sabe que não pode mudar o motivo de tê-las escrito.

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