quarta-feira, 14 de setembro de 2011

A Ciência (Nada) Exata das Listas Imaginarias

Caso fizesse uma lista, assim sem muito compromisso, de tudo que tenho na vida, tudo que posso indubitavelmente chamar de meu. Começaria inventando duas colunas, distintos grupos tão imaginários quanto as linhas de trópicos e meridianos. De um lado, começando sempre com honrosa letra maiúscula, listaria coisas realmente importantes, destas que não cabem em gavetas, em armários ou contêiner. Do outro lado, algum punhado de coisas materiais.

Entre as coisas materiais listaria alguns singelos objetos, mais pela recordação que trazem que pelo valor monetário. Talvez seja isso que chamam de valor sentimental. Em meados de 98 quando sai do meu segundo emprego, depois de 3 anos ralando pra cacete, toda a grana que recebi, gastei desesperadamente em uma loja de instrumentos musicais. Lembro claramente dos itens na nota; Uma pele de bumbo pra bateria, 2 pares de baquetas, um pandeiro meia lua, uma correia para guitarra/violão da Fender, um case bag para violão e um violão Crafter Classic elétrico. De tudo isso, o violão ainda me acompanha. Por varias vezes tentei vende-lo, trocar por outro instrumento ou por qualquer coisa aleatória. Varias pessoas já tocaram com meu violão, amigos e não amigos. E ele continua lá, firme e forte. Mais que um violão, pra mim ele é o símbolo da resistência de um sonho. Hoje eu toco o violão que comprei a mais de 10 anos, e isso me faz feliz de um jeito peculiarmente especial.

Não sou espiritualizado a ponto de me considerar livre do desejo em bens materiais, mas pratico no dia a dia um certo desapego sincero. Tenho prazer em passar adiante todos os livros que já li ou os discos que já não ouço mais. Se em determinado momento encontro-me em situação privilegiada, não me incomodo em dividir a conta de forma desigual ou mesmo de não dividir a conta. E diferente do que pode parecer a quem não me conhece de fato, faço isso por acreditar na sinceridade e na reciprocidade. Já fui acusado por alguns idiotas de tentar comprar as pessoas e isso soa tão patético que entra na minha Ignored List. Mas até consigo compreender que esse desapego às convenções de propriedade e posse, pode assustar algum desavisado que veja cifrões onde eu não vejo nada. Acho até compreensível que nesse universo capitalista ao extremo, qualquer ação que vá contra esse instinto de posse e mais valia, seja confundido com manipulação. Talvez eu me foda um dia, mas sei que não há de faltar um amigo pra dividir (ou não) uma cerveja. Muitos dirão que fracassei, por não ostentar riquezas e bens materiais que encham os olhos, mas a riqueza que procuro é invisível aos olhos.

De tudo que tenho na vida, nessa lista imaginaria com seus trópicos e meridianos, o lado de itens materiais não seria muito longa. O velho Crafter, alguns livros e um par de gaitas de boca. Alguns LPs antigos que ouço raramente, porque a vitrola quebrou. Minha lista não teria mais linhas que o necessário, sem lacunas a serem preenchidas com sonhos de consumo. Sem essa pressão social por carro do ano e casa própria, muito menos pela corrida incansável pelo primeiro milhão. Talvez eu seja um sujeito simples, sem desejos megalomaníacos. Normalmente os meus desejos e planos, envolvem uma condição irrevogável de ter por perto as pessoas que quero bem. Mas se declarar um sujeito simples nos dias de hoje soa como imensa vaidade, e autopromoção me deixa entediado.

Na realidade a lista que me causaria certo orgulho escrever, seria essa de coisas que os olhos nem sempre podem ver e que tampouco cabem no bolso. Nela colocaria o nome de cada amigo, e mesmo que pudesse generalizar e comprimir isso em uma única linha, uma única palavra. Não seria justo pela importância que cada criatura em especifico tem. Listaria todos eles adjetivando aquilo que lhes considero mais valioso, e por certo, valioso a ponto de sobrepor cada defeito que inevitavelmente terão. Listaria uma porção de boas lembranças, porque bem sei o quanto elas podem ser analgésico em momentos difíceis. Criaria uma confusão mental das mais agradáveis ao tentar explicar essa mistura, que não se sabe onde começa nem onde termina, isso que chamamos amizade e família. Não me deteria a critérios genéticos nessa descrição, pois não sei quem é mais família e quem é mais amigo. Como acabei de dizer, criação insólita essa que não se sabe onde começa nem onde termina, mas que vale mais que todo ouro do mundo.

E se assim, descompromissado, tivesse mesmo a idéia de escrever essa lista, por certo desistiria nas primeiras linhas. Pois não há motivos pra listar aquilo que já se tem. Pela pouca importância dos bens materiais, e pela demasiada e justa importância dos valores sentimentais. A vida é curta demais pra ficar contando nos dedos ou nos milhares de caracteres de uma calculadora, tudo nos traz alguma alegria. Alegria se encontra em garrafas de cerveja e em singelos por do sol. Como mensurar isso.??? Bobagem...

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