quarta-feira, 9 de julho de 2014

No Galope do Acaso

Há quem não acredite no acaso. Eu me encanto com ele a cada movimento das peças sobre o tabuleiro.

O surfista que fica horas esperando a onda certa não sabe que horas ela virá. Não é um encontro romântico com hora certa. Não é uma sessão de cinema com lugar marcado. É apostar no acaso. É o feeling de quem conhece e respeita o mar, esperando a hora em que ele lhe retribuirá tal carinho.

Meu avô sempre dizia que o cavalo só passa encilhado uma vez. Na intenção de dizer "hey, aproveite as oportunidades". Talvez alguns desses cavalos, soltos pela coxilha, tenham sido encilhados pelo acaso.

Reza a lenda que Sir Isaac Newton estava tranquilamente sentado sob a sombra de uma macieira quando uma despretensiosa maça lhe caiu sobre a cabeça. Ok, é apenas um mito. Mas realmente foi observando a queda sempre perpendicular de uma maça que o levou a pensar a teoria gravitacional desenvolvendo a famosa lei da gravidade. O acaso dessa vez encilhou um cavalo que Newton não deixou de montar. Ou talvez por um instante ele fosse o surfista domando gentil a força do mar, na espera pela onda certa.

Sei que há mais que o acaso nisso, há no mundo tantas energias, frequências e sintonias que seria simplista e ingênuo colocar tudo na conta do acaso. Mas não são os deuses do destino que te fazem conhecer alguém legal caralho, num dia que tinha tudo pra ser chato pra caralho. Há muitos dias legais pra caralho e há muita gente chata pra caralho também. Mas há um prazer misterioso em imaginar que tu conheceu alguém que, ocasionalmente, tem uma avó que nasceu no mesmo lugar que a tua avó e que tem um avô que tinha o mesmo trabalho que o teu.

Ano passado sofri um acidente de moto e fraturei a perna. Nessa época eu morava em Curitiba e estava visitando minha mãe no interior do Paraná. A perna que eu quebrei tem uma grande tatuagem em alusão ao álbum The Wall, do Pink Floyd. Conversando com o ortopedista, depois do diagnostico, ele perguntou sobre a tatuagem e por fim descobri que ele também morava em Curitiba e que também estava no show do Roger Waters em Porto Alegre em Março de 2012. Nada demais, é de fato apenas um fragmento de uma história solta na minha memória, envolta na simplicidade do acaso de um acidente de moto.

Entender o acaso e aceita-lo como timoneiro não é tarefa simples, talvez nem seja uma questão de escolha também. A vida é sempre muito urgente de imediatismos. Quase sempre queremos tudo na ânsia da impaciência, tudo plug n play; Fast food; Just in time. Mas são coisas da juventude, quanto mais tempo se tem para viver, mais pressa se tem em viver tudo ao mesmo tempo. Como a urgência em fotografar o pôr do sol, antes mesmo de apreciar o pôr do sol. O registro do momento passa a ser mais importante que o momento.

Você que está lendo esse texto provavelmente não chegou até aqui por acaso. Mas talvez quando fechar o navegador, com esse ar de tempo perdido, por acaso entenda que há mais na vida que planos e projetos. Por mais que a areia da ampulheta corra urgente, ela irá sempre na mesma direção.

Tudo bem, não é exatamente o acaso que coloca o surfista na água e o faça paciente esperar a melhor onda. A probabilidade está do seu lado. Também não foi o acaso que inventou o pôr do sol e nem é ele quem derruba as maças. Talvez os cavalos do acaso pastem soltos pela coxilha sem cela, esperando alguém que lhes queira montar.

Quem sabe o acaso more no improvável instante em que tu não espera que nada relevante aconteça. E talvez o acaso morra toda vez que alguém tente explicar, de um jeito urgente e simplista, o que é o acaso.

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