quinta-feira, 3 de julho de 2014

Entre Metáforas e Quebra Cabeças

Talvez faça parte da natureza humana sentir-se velho na hora errada e consequentemente, sentir-se jovem na hora errada.

Um guri de 12 anos fala aos de 10 com ares de superioridade. É um velho aos olhos inexperientes de quem ainda não viveu mais de uma década. Da mesma forma me sinto velho, quando conto aos amigos mais jovens, de todas as coisas que já vivi, com ares de quem pode de alguma forma passar adiante esta pífia sabedoria de mesa de bar.

Velhos tem uma única obrigação na vida; Saber contar boas histórias.

E entre os velhos, alguns terão a fina habilidade de usar a metáfora.

Pois poucas coisas são tão encantadoras quanto as sutilezas da metáfora. Tudo fica mais bonito, embrulhado feito presente, em uma metáfora enfeitada. Grandes pensadores fizeram da metáfora exagerada os alicerces do seu trabalho. George Orwell, por exemplo, em "A Revolução dos Bichos" retratou todas as nuances da sociedade metaforizando a essência do ser humano. Também Neruda, comunista, politizado até os ossos, em seus mais singelos poemas de amor, metaforizava os preceitos políticos dos quais acreditava. E o que dizer de Kafka, que eternizou da forma mais nonsense possível a psique humana, na metáfora da transmutação.

Há tanta beleza em uma metáfora, quanto há naquele avermelhado pôr do sol. No vermelho da maça que muda destinos, seja Adão ou Newton seu nome. E assim como há sutileza no desabrochar de uma rosa rompendo o orvalho congelado sobre suas pétalas. Assim como a fúria do estrondoso trovão, que iluminou todo o céu com a força pura e natural de um raio.

Talvez sentir-se velho seja uma pequena metáfora também. Afinal sempre me sinto velho quando procuro lembranças. São tantas coisas amontoadas pelos cantos da minha cabeça, como em uma biblioteca muito antiga e empoeirada. Me sinto velho e cansado. As escadas que levam as lembranças nas prateleiras superiores fazem meus joelhos doerem. Ou me fazem imaginar que não vale a pena tentar.

Em meio às minhas mais belas metáforas, guardo alguns retratos teus escondidos em algum canto da minha memória. E quando isso falha, como quase todas as minhas boas lembranças, eu procuro em outros lugares. No fim das contas eu acabei associando teu rosto a quase tudo que me agrada.

Dessa vez foi um rótulo de cerveja, uma que eu disse que você iria gostar. Eu até disse os motivos mas você não deu bola. E eu entendo, afinal, já disse tantas coisas mesmo. Quase tudo que eu pensei e senti, na mesma desordem que pensei e senti. E no fim das contas aquele era mesmo eu, um quebra cabeças espalhado pelo chão de um quarto de hotel.

Eu sei que ás vezes falo demais, e que ás vezes espero que o mundo seja um pouco mais simples do que um quebra cabeças desconexo. Simples como teu sorriso.

Um dia, há muito tempo, eu tentei imaginar como seria fácil gostar de alguém. Mas algo gritava em meus ouvidos - Improvável.

Um dia sem querer, sem muitos planos ou expectativas, esse alguém deixou que eu entrasse pela porta. E esse velho, de All Star sujo e camiseta do Ramones, com os bolsos carregados de metáforas e devaneios, por algum motivo bobo te roubou um beijo. E eu nunca mais quis ir embora.

Agora, sem metáforas, precisa ir e não consegue.

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